sábado, 14 de julho de 2012

Estamos vivendo o apogeu da cristandade?


Não, a cristandade nunca esteve numa situação tão ruim quanto hoje. Alguns dizem que "temos templos, conquistas, influência etc." e completa que é bom vivermos neste tempo. Se buscar na Palavra de Deus, Ele nunca pediu que construíssemos templos, conquistássemos espaço no mundo ou tivéssemos influência política aqui. Pelo contrário, não vivemos um apogeu mas o fundo do poço, o ponto em que o Senhor está prestes a vomitar o testemunho cristão de sua boca (Laodiceia - Ap 3), a época que precede a apostasia completa.

O lugar do cristão neste mundo é de peregrino, como foi Abraão em terra alheia, pois sua morada é no céu. O próprio Senhor deu o exemplo, não se intrometendo nas questões deste mundo, mas morrendo e ressuscitando para tirar um povo daqui. Ele não nos disse para construirmos catedrais ou grandes e poderosas organizações aqui. Gabar-se das "conquistas" da cristandade soa muito como Nabucodonosor gabando-se da Babilônia que construiu (sabia que a cristandade é chamada de Babilônia no Apocalipse?):

Dan_4:30 Falou o rei, dizendo: Não é esta a grande Babilônia que eu edifiquei para a casa real, com a força do meu poder, e para glória da minha magnificência?

Apo_18:2 E clamou fortemente com grande voz, dizendo: Caiu, caiu a grande Babilônia, e se tornou morada de demônios, e covil de todo espírito imundo, e esconderijo de toda ave imunda e odiável.

  O que dizer dos líderes que existem por aí, mas os líderes que encontramos na Palavra de Deus eram os que tinham responsabilidade sobre uma assembleia local (anciãos, bispos ou presbíteros), conforme é ensinado nas epístolas. Considerando que o ensino das epístolas (a doutrina dos apóstolos) é de um corpo múltiplo de anciãos para cuidarem de uma congregação local, e também que Apocalipse não é um livro de doutrina, mas de símbolos proféticos, só posso enxergar no "anjo" (singular) de cada uma das sete igrejas ali como o papel desses mesmos anciãos, porém em unanimidade quanto à sua responsabilidade.

  A cultura religiosa romana menciona Pedro tomando a dianteira, devo lembrá-los  que ele era um dentre os apóstolos. Eles, juntamente com os profetas do Novo Testamento, formaram o alicerce da casa de Deus, porém depois que partiram não deixaram os cristãos nas mãos de outros apóstolos. Após sua partida os cristãos ficaram entregues "a Deus e à palavra da sua graça; a ele que é poderoso para vos edificar e dar herança entre todos os santificados". At 20:32

Apóstolo é uma coisa, líder é outra. Como já expliquei, biblicamente os apóstolos e profetas do Novo Testamento tiveram o seu papel no estabelecimento do alicerce da igreja, da qual Jesus é a Pedra angular. O que existe agora são pedras, todas iguais, que fazem parte das paredes da casa de Deus.

Efs 2:20-22 Edificados SOBRE O FUNDAMENTO DOS APÓSTOLOS E PROFETAS, de que Jesus Cristo é a principal pedra da esquina; No qual todo o edifício, bem ajustado, cresce para templo santo no Senhor. No qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus em Espírito.

Para entender o papel bíblico dos apóstolos e profetas, basta fazer a pergunta "De que apóstolos e profetas ele está falando sobre os quais somos edificados?" Certamente não é de alguém vivo em nossos dias, pois com poderíamos estar sendo edificados sobre um fundamento que não existia, digamos, há 100 anos ou mais?

Portanto os "líderes" (se gosta de chamar assim) que encontro no Novo Testamento são os anciãos, presbíteros ou bispos (dependendo da passagem ou tradução) ou ainda pastores (não no sentido de dom, mas de zeladores do rebanho). Porém isso nada tem a ver com o modelo adotado pela religião, que é de um homem à frente de uma congregação. Você não encontra um modelo assim na igreja em Atos ou na doutrina dos apóstolos, mas sempre são vários os responsáveis por uma assembleia local (não confundir com o dom de pastor que, assim como o evangelista e o mestre são dons universais, não locais). Um homem (singular) à frente de uma congregação simplesmente não tem fundamento bíblico.

2Co 11:13-15 Porque tais falsos apóstolos são obreiros fraudulentos, transfigurando-se em apóstolos de Cristo. E não é maravilha, porque o próprio Satanás se transfigura em anjo de luz. Não é muito, pois, que os seus ministros se transfigurem em ministros da justiça; o fim dos quais será conforme as suas obras.

2Tm 3:1-7 Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos trabalhosos. Porque haverá homens amantes de si mesmos, avarentos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a pais e mães, ingratos, profanos, Sem afeto natural, irreconciliáveis, caluniadores, incontinentes, cruéis, sem amor para com os bons, Traidores, obstinados, orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus, Tendo aparência de piedade, mas negando a eficácia dela. Destes afasta-te. Porque deste número são os que se introduzem pelas casas, e levam cativas mulheres néscias carregadas de pecados, levadas de várias concupiscências; Que aprendem sempre, e nunca podem chegar ao conhecimento da verdade.

Apo 18:10-13 Estando de longe pelo temor do seu tormento, dizendo: Ai! ai daquela grande Babilônia, aquela forte cidade! pois numa hora veio o seu juízo. E sobre ela choram e lamentam os mercadores da terra; porque ninguém mais compra as suas mercadorias: Mercadorias de ouro, e de prata, e de pedras preciosas, e de pérolas, e de linho fino, e de púrpura, e de seda, e de escarlata; e toda a madeira odorífera, e todo o vaso de marfim, e todo o vaso de madeira preciosíssima, de bronze e de ferro, e de mármore; E canela, e perfume, e mirra, e incenso, e vinho, e azeite, e flor de farinha, e trigo, e gado, e ovelhas; e cavalos, e carros, e corpos E ALMAS DE HOMENS. (quando o Apocalipse foi escrito ainda não se vendia planos de TV a cabo).

Desculpe se pareceu que estou criticando homens, não estou. O problema são as doutrinas e práticas, e devemos sim ficar alertas contra elas como o Senhor advertiu que seus discípulos ficassem alertas contra "o fermento dos fariseus". Se temos a Palavra de Deus como guia não devemos nos afastar dela ou erraremos. Quando olhamos todas as coisas que a cristandade construiu não podemos deixar de pensar no que o Senhor disse, quando seus discípulos se gabaram da maravilha que era o Templo (e olha que era um templo que Deus tinha mandado construir!).

A igreja de Deus neste mundo são TODOS os salvos por Cristo, e isto inclui eu e você. Um pastor me disse  que só pode conhecer e desfrutar da igreja quem está no meio dela, parece que só quem está numa organização criada por homens é igreja, e não é assim. Não é o serviço que Deus busca, mas adoradores "que o adorem em espírito e em verdade". Deus está procurando mais Marias do que Martas, mas nós temos a tendência de ser como Caim e querer apresentar a Deus o trabalho de nossas mãos. Ele quer ver Cristo engrandecido em nosso meio, não cristãos engrandecidos e falando de suas obras.

Faça um exercício: busque na Palavra de Deus. Se você realmente tiver um coração para o Senhor irá considerar a Palavra de Deus como seu guia, e não o que a cristandade adotou por tradição. O catolicismo romano diz se fundamentar na Palavra e na tradição dos santos padres, porém o protestantismo faz o mesmo: examine o quanto há de tradição no protestantismo (templos, clero, corais, dízimos etc.) e verá que não é muito diferente do catolicismo.

A grande meretriz, Babilônia, de Apocalipse nada mais é do que a versão prostituta daquela que deveria ser noiva, e engloba toda a profissão cristã apóstata, não apenas uma ou outra denominação. Ela tem dinheiro, ela tem influência até sobre governos (Roma e bancada evangélica lembram algo?), mas Deus irá destruí-la, como fez com a Babilônia que era o orgulho de Nabucodonosor. É fora desse "arraial" que o cristão deve estar, não recebendo tapinhas nas costas dados pelo mundo, mas compartilhando da rejeição que Cristo sofreu aqui. Se você colocar-se fora do arraial religioso verá o quanto de rejeição existe hoje, até mesmo vinda de cristãos.
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1Pe_3:15 Antes, santificai ao Senhor Deus em vossos corações; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Podemos confiar no Novo Testamento?



Nas próprias epístolas temos as evidências de que é nelas que encontramos a autoridade apostólica, portanto creio ser esta a evidência de que estamos em terreno seguro. As epístolas circulavam entre as assembleias levando nelas a autoridade dos apóstolos e é nelas que os próprios apóstolos indicam que devemos buscar a doutrina.


2Pe 3:15-16 "E tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor; como também o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada; Falando disto, como em TODAS AS SUAS EPÍSTOLAS, entre as quais há pontos difíceis de entender, que os indoutos e inconstantes torcem, eIGUALMENTE AS OUTRAS ESCRITURAS, para sua própria perdição.

Pedro iguala os escritos de Paulo às "outras escrituras", ou seja, ao Antigo Testamento e às outras epístolas dos apóstolos que andaram com Jesus (e cujas epístolas foram pré-autenticadas por Jesus, como explicarei adiante).

Col_4:16 E, quando esta epístola tiver sido lida entre vós, fazei que também o seja na igreja dos laodicenses, e a que veio de Laodicéia lede-a vós também. 

Confiar na tradição, como faz o catolicismo, nos deixaria à mercê de interpretações para justificá-las ou não à luz das epístolas. Para resolver tal dilema o catolicismo simplesmente determinou que em caso de discrepância entre as Escrituras e a tradição fica valendo a tradição. E deu no que deu...

Acima de tudo devemos ter em mente que é o próprio Deus quem tem interesse em preservar a doutrina que os apóstolos receberam do Espírito Santo, e isto Deus faz inclusive impedindo que tenhamos acesso a algumas epístolas que os apóstolos escreveram, mas cujo teor o Espírito Santo achou por bem não chegar até nós. Não temos hoje, por exemplo, a epístola a Laodicéia da qual o apóstolo Paulo fala no versículo acima. E também não temos a epístola de Paulo aos Coríntios escrita antes da que chamamos de "Primeira aos Coríntios", a qual ele menciona em 1 Co 5:9.

Mas não é apenas no testemunho dos apóstolos que podemos nos basear para entender a inspiração divina que têm os seus escritos. Jesus pré-autenticou, por assim dizer, os ensinos que seriam dados através dos apóstolos depois de sua partida:

Joã 14:26 Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará [aos apóstolos] todas as coisas, e vos fará lembrar [aos apóstolos] de tudo quanto vos tenho dito. 

Alguns alegam que esta passagem foi dita aos discípulos de Cristo de uma maneira geral, e portanto estaríamos incluídos nesta mesma promessa. Mas não é assim. Como poderíamos nós, que nascemos 2 mil anos depois, achar que o Espírito nos "lembraria" de tudo o que o Senhor disse se nem mesmo estávamos lá? A passagem abaixo também tem este caráter exclusivo, pois foi o Espírito quem disse aos apóstolos, palavra por palavra, aquilo que deviam escrever. Daí a inspiração verbal das Escrituras.

Joã 16:13 Mas, quando vier aquele Espírito de verdade, ele vos guiará [aos apóstolos] em toda a verdade; porque não falará de si mesmo, mas dirá [aos apóstolos] tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará [aos apóstolos] o que há de vir. 

1Co 2:13 As quais também falamos, não com palavras de sabedoria humana, mas com as [palavras] que o Espírito Santo ensina,

O Espírito Santo iria, não apenas LEMBRAR os apóstolos das palavras de Jesus, mas iria ENSINAR a eles todas as coisas e GUIÁ-LOS em toda a verdade, como canais vindos diretamente dos céus, revelando o ensino para o presente e para o porvir. Estas são "as coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, E não subiram ao coração do homem", ou seja, não são tradições, costumes ou fábulas humanas, mas a expressa Palavra de Deus vinda dos céus.

2Pe_1:16 Porque não vos fizemos saber a virtude e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, seguindo fábulas artificialmente compostas; mas nós mesmos vimos a sua majestade

Tudo isso o Senhor prometeu que revelaria pelo Espírito aos apóstolos, portanto não cremos "na memória histórica" dos apóstolos ou na "tradição dos pais", como chamam os católicos, mas na revelação da Palavra de Deus pelo Espírito Santo.

O argumento muito usado pelos católicos de que foi a igreja católica que decidiu o que faria ou não parte do cânon do Novo Testamento é ridículo.

Primeiro, porque não existia "igreja católica" na época. Naquela época só existia a igreja. Chamá-la de "igreja católica", como se faz hoje para distinguir aquela que é comandada de Roma das milhares de denominações cristãs, faria tanto sentido quanto chamar a guerra de 1914-1918 de "Primeira Guerra Mundial". Este título só foi usado após ocorrer outra guerra mundial (nos livros e jornais anteriores aos anos 40 ela é chamada simplesmente de Grande Guerra).

Segundo, porque a formação do cânon pelos cristãos dos primeiros séculos foi simplesmente atestar de uma maneira formal quais eram os textos que nos séculos anteriores circulavam pelas assembleias locais e eram reconhecidos como a Palavra de Deus. E por que os cristãos da época fizeram isso? Justamente para evitar que lendas e tradições fossem tomadas como sendo a Palavra de Deus, o que já estava acontecendo por alguns hereges. Portanto, as epístolas são a Palavra de Deus revelada aos apóstolos. A tradição é a interpretação que homens deram a essas epístolas à luz da época em que viveram. Devemos receber a primeira como a Palavra de Deus e refutar a segunda como tendo igual status.

Paulo explica como se cumpriu a promessa que o Senhor deu de que o Espírito revelaria a Palavra de Deus aos apóstolos em uma passagem que às vezes lemos sem identificar que Paulo está falando ali dos apóstolos, e não dos crentes em geral. Esta passagem deve ser lida como a concretização da promessa que o Senhor fez AOS APÓSTOLOS, os quais, pelo Espírito, seriam lembrados de todas as coisas que o Senhor lhes tinha dito, e vou inserir meus comentários para deixá-la mais clara:

1Co 2:9-11  Mas, como está escrito: As coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, E não subiram ao coração do homem, São as que Deus preparou para os que o amam. Mas Deus no-las revelou [a nós, os apóstolos] pelo seu Espírito; porque o Espírito penetra todas as coisas, ainda as profundezas de Deus. Porque, qual dos homens sabe as coisas do homem, senão o espírito do homem, que nele está? Assim também ninguém sabe as coisas de Deus, senão o Espírito de Deus.

Em outra passagem Paulo autentica seus próprios escritos explicando que não são ensinos de homens, ou seja, não são tradições humanas. Mais uma vez entendemos o papel que tiveram os apóstolos como canais exclusivos da revelação de Deus vinda dos céus.

Gál 1:11-12 Mas faço-vos saber, irmãos, que o evangelho que por mim foi anunciado não é segundo os homens. Porque não o recebi, nem aprendi de homem algum, mas pela revelação de Jesus Cristo.

Os cristãos daquela época recebiam seus escritos como a Palavra de Deus, e não como sabedoria humana ou meras tradições.

1Ts 2:13 Por isso também damos, sem cessar, graças a Deus, pois, havendo recebido de nós a palavra da pregação de Deus, a recebestes, não como palavra de homens, mas (segundo é, na verdade), como palavra de Deus, a qual também opera em vós, os que crestes. 

1Co 14:37 Se alguém cuida ser profeta, ou espiritual, reconheça que as coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor. 

Tudo isso não apenas nos autoriza a encarar o Novo Testamento como a Palavra de Deus revelada aos apóstolos, como deixa claro o erro dos teólogos moderninhos que insistem em refutar os escritos de Paulo como se fossem meras opiniões de um solteirão machista. Para esses fica valendo a descrição que Pedro lhes dá em sua segunda epístola 3:16:

"indoutos e inconstantes" (ARF), ou como está em outras versões, "espíritos ignorantes ou pouco fortalecidos" (Ave Maria), "homens sem instrução e vacilantes" (CNBB), "ignorantes e instáveis" (NVI). Quem quer que negue a autenticidade das epístolas de Paulo como a Palavra de Deus pode adotar para si qualquer um desses adjetivos.E vergonhoso a falta de respeito que muitos pastores tem pelo Apostolo Paulo.

Devemos ter tudo em comum como os primeiros cristaos?



É normal que alguns cristãos, principalmente recém convertidos, se apaixonem pela ideia de venderem tudo e distribuírem entre os mais necessitados. Eu mesmo, quando vi o filme "Irmão Sol, Irmã Lua", uma história romanceada da vida de São Francisco de Assis, acreditei que viver daquele jeito seria possível. Mas o próprio filme mostrava que o clero da época só acatou a ideia daqueles jovens despojados porque atraía mais fiéis para as missas, como faz o clero católico romano e também protestante em nossos dias ao fazerem vista grossa a padres, pastores e cantores "pop stars".

A ideia de dar tudo para os pobres é muito bonita em tese, mas na prática devemos agir com sabedoria. Distribua todos os seus bens com os pobres e em um mês estarão todos pobres de novo, inclusive você.  Quando escutar algum pregador constrangendo seus ouvintes a adotarem uma vida despojada, primeiro é bom verificar a vida que esse pregador leva para ver se ele pratica o que prega.

Mas, ainda que pratique, o argumento de que em Atos os cristãos vendiam tudo o que tinham e dividiam entre todos não procede e mostra um desconhecimento total do fato de o livro de Atos não ser um livro de doutrina, mas uma narrativa de uma época de transição entre o judaísmo e o cristianismo. Em Atos dos Apóstolos vemos exatamente isto, os atos dos apóstolos (e dos primeiros cristãos) e às vezes ali são mostrados atos errados também.

Analisando especificamente o ato de vender tudo e distribuir entre outras pessoas, primeiro vemos que era entre os irmãos que eles compartilhavam o que tinham, e não com o mundo pagão em geral. Segundo, aquilo era uma ação espontânea e não uma ordenança ou obrigação. O próprio apóstolo Pedro deixa bem claro que ninguém era obrigado a vender o que tinha para repartir com os irmãos. Ananias, que foi morto não por ter retido parte do lucro obtido com a venda de seu imóvel, mas por ter mentido ao Espírito Santo, poderia fazer o que quisesse com seus bens, inclusive conservá-los para si. É o que Pedro explica a ele:

Ats 5:3-4 Disse então Pedro: Ananias, por que encheu Satanás o teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo, e retivesses parte do preço da herdade? Guardando-a não ficava para ti? E, vendida, não estava em teu poder? (outra versão diz: "Acaso não o podias conservar sem vendê-lo? E depois de vendido, não podias livremente dispor dessa quantia?")


A decisão dos primeiros cristãos de vender tudo e repartir com os irmãos acontecia em um momento em que a igreja vivia seu primeiro amor e desfrutava do poder de Deus agindo sem os impedimentos que hoje temos. Quais? O fato dos cristãos estarem divididos em milhares de seitas e o mal ter se infiltrado em seu meio. Hoje qualquer um se diz "irmão", até o pregador da TV que só sabe pedir dinheiro. Você venderia tudo o que tem para dar ao pregador e ele comprar outro helicóptero ou reformar sua mansão?

Um olhar cuidadoso verá que mesmo no livro de Atos as condições iam mudando e se adaptando conforme o mal começava a se introduzir na igreja. Eles começam vivendo em comunidade, tendo tudo em comum e vendendo e distribuindo entre si seus bens:

Ats 2:44-45 E todos os que criam estavam juntos, e tinham tudo em comum. E vendiam suas propriedades e bens, e repartiam com todos, segundo cada um havia de mister.

Então vemos em Atos 4 que já não dividiam mais entre si, mas passaram a trazer o que tinham aos apóstolos, para estes fazerem a distribuição. Lembrando mais uma vez que tudo acontecia dentro do círculo dos irmãos, e não era uma campanha para dividir tudo com todos os pobres dentre os pagãos. Entregue hoje seus bens as pobres necessitados do Taliban no Afeganistão e eles venderão tudo para comprar armas.

Ats 4:32-35 E era um o coração e a alma da multidão dos que criam, e ninguém dizia que coisa alguma do que possuía era sua própria, mas todas as coisas lhes eram comuns... Não havia, pois, entre eles necessitado algum; porque todos os que possuíam herdades ou casas, vendendo-as, traziam o preço do que fora vendido, e o depositavam aos pés dos apóstolos. E repartia-se a cada um, segundo a necessidade que cada um tinha.

Já no capítulo seguinte vemos o mal agindo e Ananias e Safira fazendo o que obviamente acontece com todo coração humano: querer parecer mais do que é ou que faz mais do que realmente fez. Acaso não foi assim que terminaram as boas intenções de algumas organizações beneficentes mais antigas? Há muitas que hoje promovem jantares para homenagear os que contribuem, e às vezes esses eventos custam mais caro do que aquilo que vai efetivamente chegar nas mãos dos necessitados. Algumas ONGs gastam mais dinheiro com funções administrativas e de propaganda do que com os necessitados.

Mas vamos ver o que ocorre após o conhecido episódio de Ananias e Safira, que foi resolvido de forma radical com a morte dos que mentiram ao Espírito Santo. Em um período de grande poder no início da igreja, com os apóstolos fazendo sinais e milagres, havia também uma grande responsabilidade e uma grande perda quando esta falhasse. Não é à toa que os de fora já estavam relutantes em querer fazer parte daquela comunidade onde as consequências da mentira e dissimulação eram tratadas de maneira tão severa: com a morte dos mentirosos. Já pensou se a igreja hoje vivesse nesse mesmo poder?

Ats 5:11-13 E houve um grande temor em toda a igreja, e em todos os que ouviram estas coisas. E muitos sinais e prodígios eram feitos entre o povo pelas mãos dos apóstolos.... Dos outros, porém, ninguém ousava ajuntar-se a eles; mas o povo tinha-os em grande estima.

A passagem seguinte deixa muito claro que tudo aquilo era um processo: primeiro eles dividiam tudo entre si, depois passaram a entregar aos apóstolos para que estes determinassem como dividir, e agora vemos que homens idôneos são designados especialmente para a tarefa, deixando assim os apóstolos livres para se dedicarem à Palavra. Isto porque os cristãos já não estavam na mesma disposição do princípio e agora agiam de forma egoísta, como vemos na passagem a seguir:

Ats 6:1 Ora, naqueles dias, crescendo o número dos discípulos, houve uma murmuração dos gregos contra os hebreus, porque as suas viúvas eram desprezadas no ministério cotidiano. 

Todos os que faziam parte da igreja eram judeus ou prosélitos convertidos a Cristo, mas alguns eram judeus helenistas, isto é, vindos de uma cultura grega. Estes estavam sendo prejudicados na distribuição dos recursos, o que faz os apóstolos a tomarem a providência de escolher 7 homens íntegros para cuidarem disso.

Ats 6:2-4 E os doze, convocando a multidão dos discípulos, disseram: Não é razoável que nós deixemos a palavra de Deus e sirvamos às mesas. Escolhei, pois, irmãos, dentre vós, sete homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria, aos quais constituamos sobre este importante negócio. Mas nós perseveraremos na oração e no ministério da palavra.

Se você reparar na continuação da passagem todos eles têm nomes gregos: Estêvão, Filipe, Prócoro, Nicanor, Timão, Parmenas e Nicolau. Mesmo em situações de falha do homem Deus age em graça.

Isso tudo deixa claro que no livro de Atos nem sempre encontramos as coisas já bem estabelecidas, mas ocorria ali um processo. Hoje, quando não temos mais apóstolos e nem as condições de poder e unidade que existiam no princípio, não podemos ser ingênuos achando ser possível repetir o modo de vida da igreja primitiva.

Fazer o bem e administrar para o mais necessitados é algo que todo cristão deve fazer individualmente em seu exercício com o Senhor, e não algo que devemos impor sobre as pessoas. É um erro também acreditar que pelo exercício do altruísmo os cristãos criarão um mundo melhor e mais justo, pois a Bíblia deixa bem claro que não será assim sem a intervenção direta do Senhor em sua vinda para reinar.

Algumas religiões fundamentalistas acreditam que será pelo esforço dos cristãos em transformarem as condições do mundo em mais propícias que Cristo virá reinar, mas isto é acreditar que o homem possa ter sucesso em seus empreendimentos e que os cristãos conquistar o mundo inteiro para Cristo. O "ide por todo o mundo" levando o evangelho é muito bom e louvável, mas isto não significa que todo o mundo irá se converter a Cristo.

Aliás, o "ide" foi ordenado aos apóstolos ainda em sua condição de judeus, e não de igreja de Deus. O remanescente judeu que se converterá após o arrebatamento da igreja continuará esse trabalho nos anos de tribulação que se seguirão, e até anjos estarão empenhados em levar o "evangelho eterno" aos quatro cantos do mundo. 

Como devem ser os que ministram?



É importante frisar que 1 Timóteo 3 não está falando de requisitos ou qualificação de quem ministra a Palavra nas reuniões, ainda que as características ali sejam aconselháveis. Em 1 Timóteo 3 Paulo fala dos que zelam pelo rebanho (bispos, anciãos ou presbíteros).

Nas reuniões da assembleia são os dons que são manifestos, não os ofícios (como bispos, anciãos ou presbíteros). As religiões elegeram seus próprios bispos ou presbíteros e os transformaram em dirigentes ou ministros da Palavra em suas reuniões, criando assim uma espécie de clero com exclusividade no ministério da Palavra. Mas ainda que um bispo ou presbítero tivesse também um dom de ministrar a Palavra, o ministério nas reuniões não está restrito a eles, mas é aberto aos dons. É por isso que em 1 Co 14:29-31 diz "todos",  que esses "todos" precisam ser antes conhecidos e reconhecidos pelos irmãos como pessoas que professam a sã doutrina.

1Co 14:29-31 E falem dois ou três profetas, e os outros julguem. Mas, se a outro, que estiver assentado, for revelada alguma coisa, cale-se o primeiro. Porque TODOS podereis profetizar, uns depois dos outros; para que todos aprendam, e TODOS sejam consolados.

Em Atos e nas epístolas vemos que a função dos bispos ou anciãos era de zelar pela assembleia local. Sua esfera de ação era local (e não universal como eram os dons de profeta, apóstolo, evangelista, pastor e mestre ou doutor) e um bispo não precisava ter necessariamente um dom relacionado ao ministério da Palavra. O bispo ou presbítero precisava ser apto para ensinar, mas isso não significava que precisava fazê-lo em público, podendo ser um irmão sábio para admoestar pessoas individualmente ou escrevendo cartas de exortação àqueles que estivessem se desviando, consolar os fracos e encorajar os irmãos de um modo geral.

Sua função era o que podemos chamar de administrativa-espiritual e de vigilância e cuidado do rebanho. Os bispos (presbíteros ou anciãos) eram também eleitos pelos apóstolos ou por indicação direta deles (não temos mais apóstolos hoje) e eram eleitos "de cidade em cidade", como na ordem que Paulo deu expressamente a Tito (e não a mim nem a você):

Tit_1:5 Por esta causa [eu, Paulo] te deixei em Creta, para que pusesses em boa ordem as coisas que ainda restam, e de cidade em cidade estabelecesses presbíteros, como já te [a ti, Tito] mandei.

Hoje não temos mais apóstolos para eleger bispos ou presbíteros ou anciãos (os nomes significam a mesma coisa), mas continuamos tendo o Espírito Santo para escolher aqueles que ele quer para que tenham zelo sobre o rebanho de Deus. Podem ser irmãos reconhecidos pela assembleia, mas não são eleitos, ordenados ou denominados como tais.

Ats 20:28 Olhai, pois, por vós, e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue.

Num estado de divisão em que hoje vivemos seria até pretensão chamar oficialmente "bispos" ou "presbíteros" homens cuja ação está limitada a apenas uma pequena parcela de todos os cristãos que vivem numa cidade. No início os bispos ou presbíteros eram eleitos pelos apóstolos ou por seus comissionados para assumirem a responsabilidade sobre TODOS os santos em uma determinada cidade, e não apenas sobre um grupo deles. E por ser um ofício local, o bispo da assembleia em uma cidade não era bispo em outra assembleia. Sua "jurisdição", se podemos chamar assim, era exclusivamente dentro de sua assembleia.

Resumindo, não existe hoje uma ordenação de bispos (presbíteros ou anciãos). E nunca -- sim, NUNCA -- existiu uma ordenação de dons como evangelistas, pastores e mestres, já que estes são designados diretamente pelo Senhor ressuscitado a partir dos céus. Se alguém ordenar você "evangelista" ou "pastor" ou "mestre" tal ordenação feita por homens não tem qualquer efeito se você não tiver um desses dons. E se você tiver recebido de Cristo qualquer um desses dons, nenhum homem poderá dizer o contrário.

Efs 4:8, 11-12  Por isso diz: Subindo ao alto, levou cativo o cativeiro, E deu dons aos homens E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, Querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo;

Ao contrário dos bispos, cuja atuação era local, os dons dados por Cristo são universais. Assim como um profeta ou apóstolo (os que lançaram os fundamentos da igreja e não estão mais entre nós) tinha uma esfera de atuação universal, assim também são os evangelistas, pastores e mestres, que foram dados para "o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo". Ou seja, um bispo de Éfeso só era bispo em Éfeso, mas um evangelista, pastor ou mestre que morasse em Éfeso era evangelista, pastor ou mestre onde quer que estivesse.

Por isso é tão fora de ordem alguém dizer que é pastor da igreja tal na cidade tal, a menos que esteja se referindo ao ofício de bispo ou presbítero. Mas neste caso não haveria apenas um, pois a função aparece sempre no plural, e jamais ele seria visto dirigindo as reuniões ou tendo a exclusividade do ministério da Palavra. Tal função (o pastor singular que é ordenado para dirigir uma congregação) não existe na doutrina dos apóstolos.

Não existem intermediários ou intermediação (seja de homens ou escolas de teologia) na dispensação que Cristo faz dos dons do Espírito. Pode apenas existir um reconhecimento dos irmãos, que percebem como Deus usa aquele irmão (que foi o caso da imposição de mãos sobre Timóteo em 1 Tm 4:14), mas nunca uma ordenação ou oficialização do dom. Portanto, o que eu estou dizendo tem a ver apenas com o cuidado que a assembleia deve ter com os que ministram (os dons), pois ainda que uma pessoa tenha um dom para o ministério da Palavra, ela pode estar contaminada com erros e más doutrinas, as quais a assembleia tem o dever de julgar e o poder de impedir que sejam trazidas nas reuniões.

Quanto aos diáconos,  eles tinham o papel de cuidar dos aspectos administrativos materiais da assembleia, enquanto os bispos cuidavam dos aspectos administrativos espirituais. Numa linguagem prática, enquanto os bispos podiam ser aqueles que detectassem necessidades espirituais, os diáconos deviam estar atentos às necessidades materiais da assembleia. Estes seriam os responsáveis por servir os necessitados e atender tudo o que diz respeito ao conforto material da assembleia. Entendo que, assim como no caso dos bispos, hoje seria pretensioso demais nomear diáconos, mas não deixamos de tê-los por reconhecer irmãos que são mais preocupados e ocupados com essas tarefas do que outros. Certamente é o mesmo Espírito que coloca no coração de uns o zelo pelo conforto espiritual da assembleia, e de outros o zelo pelo conforto material.